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ATALAIA, Vila Nova da Barquinha, Portugal
Vivendo nesta terra há 30 anos vou perguntar à história e à tradição qual a origem desta localidade. Desejo saber quem neste atractivo sítio erigiu a primeira construção, quais as obras que foram nascendo, a sua idade e as mãos que as edificaram, quais os seus homens ilustres e os seus descendentes, quem construiu as estradas, os caminhos, as pontes e as fontes. Quão agradável será descobrir em cada pedra os nossos antepassados levantando com palavras o sonho do nosso futuro. Atalaia, 18-11-2007.

31.5.11

O TELÉGRAFO DA ATALAIA - VILA NOVA DA BARQUINHA


"Ignora-se a sua história, sendo que de crer que tivesse sido ocupada por Alanos, Visigodos e Muçulmanos, e sabendo-se ao certo que em 1129 estava já em poder dos Portugueses. Tornando anos depois a cair em poder dos Mouros, foi reconquistada em 1147, por D. Afonso Henriques, que mandou reedificar o castelo medieval. Reconquistado de novo pelos Mouros estes teriam arrasado e abandonado a fortaleza, que ficou completamente despovoada, até que D. Afonso II mandou reedificar o castelo e lhe concedeu foral em 1212, com muitos privilégios para os moradores a fim de mais facilmente ser povoada. Parece que, sendo de novo destruída pelos Mouros, D. Dinis a mandou repovoar e reedificar a fortaleza, construindo-lhe a torre de menagem, e dando novo foral à povoação em 1315. Hoje está totalmente destruída e o monte coberto de mato e arvoredo, mal se pressentindo que ali tivera um forte castelo medieval.” (1)
É na encosta, ponto mais alto da Vila da Atalaia, ocupada desde tempos de antanho, que os actuais registos matriciais denominam sítio da encosta do telégrafo.
Qual a sua origem? Investiguemos...
Em Junho de 1810 dá-se a terceira invasão Francesa. A nação era o epicentro do choque de interesses das duas potências, a Inglaterra e a França. O invasor empregava o Telégrafo de Chappe e o aliado inglês empregava o Telégrafo de Balões ou Telégrafo de Bolas, usado entre as fortificações das Linhas de Torres e os seus flancos laterais. O português Francisco António Ciera, Director dos Telégrafos, inspirado nos sistemas que viu e/ou estudou, inventou o Telégrafo Óptico Português, de menor alcance mas mais económico, mais eficaz e que dava maior celeridade às comunicações. Começavam as primeiras “obras telegráficas” na nossa região. O marechal de campo José Lopes de Sousa, a partir de Abrantes, comunica a D. Miguel de Forjaz, Secretário de Estado da Guerra, o seguinte: “Tenho a honra de informar V. Exª., que se tem trabalhado na obra do Telegrafo (de Abrantes), e que posto senão ache completa toda a obra pelo que respeita a barraca e sua escada; o Telegrafo já poderia trabalhar; a corresponder-se com o da Barquinha cazo que aquelle de achasse pronto, mas não se avista ainda no lugar em que se pode collocar […] Abrantes 23 de Junho de 1810”. No dia seguinte, a 24 de Junho de 1810, o mesmo marechal de campo informa: “Hontem participei a V. Exª que não se avistava ainda daqui o trabalhar-se na colocação do Telegrafo no lugar da Barquinha, mas na mesma tarde já se divizava este trabalho, e o que hoje mais se verifica. Deos Guarde V. Exª. Abrantes 24 de Junho de 1810”.
Assim, temos por certa a data da construção do telégrafo da Atalaia, o dia 24 de Junho de 1810 (2).
Num contexto bélico o telégrafo, como um sistema de comunicação rápido à distância, era um elemento fundamental para a estratégia e para as operações de guerra.
No boletim do telégrafo central de Lisboa do dia 13 de Abril de 1812 (3), consta que pelas 9 horas e ½ da manhã, é comunicado do posto da Atalaya: “ Hontem de tarde chegaram aqui 2 Companhias de Brigada da Cavalaria Inglesa”. No mesmo boletim há uma mensagem enviada às 6 horas da tarde, agora do telégrafo de Abrantes: “Participar a Marechal Beresford, q. no dia 11 do corrente vierão huns 5000 homens de Cavallaria Inimiga a Alpedrinha, Sobreira Formosa, Fundão saquear[…] Governador”.
Pelos conteúdos das mensagens podemos perceber a importância do posto da Atalaia na Guerra Peninsular, essencialmente o seu interesse estratégico. Por aqui passavam todas as informações da Nação resultantes da ligação à linha telegráfica das Beiras: Lisboa, Atalaia, Abrantes, C.Branco, Elvas, e da ligação à linha telegráfica: Lisboa, Atalaia, Tomar, Ceiras, Zambujal, Vendas D.Maria, S.Sens, Almalaguer e Coimbra.
O telégrafo da Atalaia ainda estava a funcionar em 1832 e era parte da rede: Castelo de S. Jorge, Penha França, Monte Serves, Monte Gordo, Boavista, Santarém, Alviela, Golegã, Atalaya, Tomar, Ceiros, Alvaiázere, Monte Ver, Volta Monte, Coimbra, Agrello, Buçaco, Boialvo, Montedo, Vila Nova Juzos, A. Branco, S.º Estêvão, Morado, S.º Ovídeo e Porto (4).
Na sequência das Guerras Liberais verifica-se a destruição do telégrafo da Atalaia.
Tal tarefa coube à guerrilha constitucional, comandada pelo coronel do exército espanhol, D. Manuel Martini: “No dia 24 de Junho de 1833, dei o grito da Liberdade, acclamei o Governo Legitimo, fiz nomear outras Authoridades, soltei os prezos políticos, desarmei a Guerrilha do Corregedor, e hum forte Destacamento de Realistas de Abrantes, amparei-me de 400 armas; e de tarde … marchei para a Barquinha; ao passar destrui o Thelegrafo da Atalaia; na madrugada de 26 aprizionei hum barco que de Lisboa hia para Abrantes com 500 fardamentos completos, armamento, correame, 5 cornetas, e 20 praças da sua escolta.” (5).
O Telégrafo da Atalaia foi construído em 24 de Junho de 1810 e destruído em 24 de Junho de 1833, precisamente 23 anos depois!
Ainda hoje os registos matriciais o mantêm vivo e a mim coube-me o dever de reescrever a sua história.

(1) Almeida, João (General), Roteiro dos Monumentos Militares Portugueses, Vol II, Edição do Autor, 1946.
(2) Telégrafo da Barquinha concluído – Arquivo Histórico Militar (AHM)-DIV-1-14-269-50.
(3) Boletim do Telégrafo Central com referências às comunicações do Telégrafo de Abrantes – AHM-DIV-1-14-180-25.
(4) AHM/DIV 3-32-5-24.
(5) Ventura, António: As guerras liberais em Portalegre: Junho-Julho de 1833, Portalegre, Assembleia Distrital, 1982.

AGRADECIMENTO, ao meu preclaro amigo José Manuel d'Oliveira Vieira, colaborador do Jornal de Alferrarede, que me cedeu muita da informação para a história do telégrafo da Atalaia. O meu eterno BEM-HAJA.

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