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ATALAIA, Vila Nova da Barquinha, Portugal
Vivendo nesta terra há 30 anos vou perguntar à história e à tradição qual a origem desta localidade. Desejo saber quem neste atractivo sítio erigiu a primeira construção, quais as obras que foram nascendo, a sua idade e as mãos que as edificaram, quais os seus homens ilustres e os seus descendentes, quem construiu as estradas, os caminhos, as pontes e as fontes. Quão agradável será descobrir em cada pedra os nossos antepassados levantando com palavras o sonho do nosso futuro. Atalaia, 18-11-2007.

7.5.11

Vila Nova da Barquinha na génese dos Descobrimentos

Foram os descobrimentos portugueses feitos ao acaso? Bem pelo contrário, tiveram por alicerce muito estudo e meditação da parte do Infante D. Henrique e dos seus colaboradores.
Esta grandiosa epopeia não só tem como pontos de partida Sagres, Lagos ou o Restelo, mas tem, também, a sua génese no actual território de Vila Nova da Barquinha. Os factos abaixo demonstram que o nosso concelho está ligado à origem dos descobrimentos e nela existiram figuras intervenientes e decisivas no processo de expansão.
Um relatório redigido em Lisboa, datado de 23 de Abril de 1415, do espião castelhano Ruy Dias de Veja para o rei D. Fernando I de Aragão, dava-lhe a notícia dos preparativos da Armada que então se constituía em Portugal e nas margens do rio Zêzere (Sesar). Dizia então o relatório: «EI Prior et los maestres mandan fazer senhas galeotas de sesenta rremos cada una, saluo el maestre de Santyago. Et fazenlas en el rryo de Sesar [Zêzere] que es cerça de Punete, et entra en Tajo aquel rrio a syete leguas de Santareno Et ellos estan todos en sus tierras, adereçando pela la partyda, que na todos de partyr con el rrey.» (1)
Questionei-me, porque eram construídas as galeotas no nosso concelho mais precisamente nas
margens do rio Zêzere (entre as Limeiras e o Cafuz), local onde, ainda hoje, é possível visualizar a existência de um antigo porto. Dir-me-ão, certamente por segredo, alma de qualquer projecto humano tendo em vista afastar qualquer putativa antecipação de concorrentes, e que à data eram muitos. Logo, nada melhor que a construção das galeotas se fizesse num local de problemático acesso, longe das cidades e dos olhos curiosos das gentes. Seria? Certamente … mas não só. Há um facto que não posso olvidar, uma criatura de nome Frei Gonçalo Velho.
A primeira expedição portuguesa que se pôde chamar de descobrimento, foi a que enviou o infante D. Henrique, em 1416, à Terra Alta: “Depois de empreender diversas viagens, ao longo da Costa de África, a sua caravela rumava ao Ocidente. Gonçalo Velho, familiarizado com a ciência náutica delineou o itinerário da primeira navegação cientifica – sem terra à vista e em pleno mar largo – da qual resultou o estudo das correntes marítimas, a descoberta da Terra-Alta e mais tarde Santa Maria” (2)
Dúvidas não restam que na epopeia dos descobrimentos foi relevante o papel desempenhado pelo então comendador do Castelo de Almourol, título que detinha desde o ano de 1426.
Como sabemos existia uma ligação muito “íntima” da Ordem de Cristo, proprietária da Quinta da Cardiga ao projecto Descobrimentos. Frei Gonçalo, segundo os historiadores, era um homem audaz e desprezava a superstição de terror que, à data, se abatia sobre os oceanos. Naqueles tempos as lendas iam desde a imobilidade dos mares, das quilhas que se prendiam até à infestação de mostrengos de toda a espécie, que nas palavras de Fernando Pessoa foram convertidos em "tectos negros do fim do mundo". Mas, o comendador de Almourol era um homem com poder, valente e corajoso e rumou sempre mais adiante. Conta-se que " . . . no ano do Senhor, de 1431, reinando em Portugal Ey-rei D. João de Boa Memória, decima em numero e primeiro de nome, tendo o dito Infante, (D. Henrique) em sua casa um nobre fidalgo e esforçado cavalheiro chamado Frei Gonçalo Velho das Pias, comendador do Castelo de Almourol, que está sobre o Rio Tejo, arriba da vila de Tancos, de quem por sua virtude grande esforço e prudência tinha muita confiança, o mandou descobrir as ilhas dos Açores, a Ilha de Santa Maria, ou também, porventura a de S. Miguel: o qual, aparelhando um navio com as coisas necessárias para sua viagem, partiu no dito ano da vila de Sagres e navegando com prospero vento para o Ocidente, depois de passados alguns dias de navegação, teve vista de uns penedos que estão sobre o mar, e se vêm de Maria, e de uns marrulhos que fazem outros que estão ali perto, debaixo do mar, chamados agora todos – Formigas – nome imposto por ele … e se tornou ao Algarve... no ano seguinte 1432 tornou o infante . . . a mandar o mesmo frei Gonçalo Velho a descobrir o que dantes não achara, dando-lhe por regimento, que passasse além das Formigas … O qual Gonçalo Velho tornando a fazer esta viagem… houve vista de Ilha em dia de Ascensão da Nossa Senhora, 15 de Agosto de… 1432, que é o ano em que se achou a Ilha de Santa Maria… " (3)
Toda a Nação colaborou no nosso maior empreendimento, os Descobrimentos Portugueses, mas estes só foram possíveis graças às pessoas, aos meios e às técnicas de navegação. As primeiras
viagens foram feitas em barcas e só mais tarde, já com navios mais robustos e capazes de navegar com ventos contrários, as caravelas. Mas se há alguém proeminente, é certamente Gonçalo Velho, comendador do Castelo de Almourol e da Quinta da Cardiga, corajoso cavaleiro da Ordem de Cristo, ousado mareante da Escola de Sagres e egrégio companheiro do Infante Dom Henrique que, presumivelmente, construiu as galeotas na sua Comenda junto do Rio Zêzere perto do lugar de Frade (actual Limeiras) e de Fernando Eanes (actual Outeiro) e daqui levou as nossas gentes para esta colossal epopeia, a expansão ultramarina.

(1) Monumenta Henricina, II, Coimbra, 1960, doc 57, p. 132-135
(2) Guia de Portugal Artístico, Açores, Robélia Sousa Lobo Ramalho, 13.º Volume, 1946
(3) Gaspar Frutuoso, Saudades da terra, L.III, Santa Maria, ed. 1922



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