O choque de uma razão contra outra razão dá a questão. Ou melhor há sempre uma razão que se opõe a outra razão.
Esta oposição de razões à estrutura da questão dá o denominado princípio do contraditório.
Por defeito de ofício, quiçá virtude, quando me contam a história dos vencedores (e a nossa história é, predominantemente, de vencedores) quase sempre é esquecida pelo escritor, ou narrador, a história dos vencidos. Daí o sábio hábito de ouvir as duas partes da oposição das suas razões e ... depois tirar as nossas conclusões.
Para fazer as contas à medida (significado de razão) procurei a versão da Batalha da Asseiceira na versão dos vencidos.
Nesta tarefa árdua ajudou-me o meu amigo José Luís Assis, historiador de generosidade do tamanho do mundo, conseguindo descobrir a obra abaixo referida. Esta versão é a do Barão de Saint Pardoux que em 1835 publicou uma obra sobre o título “CAMPAGNES DE PORTUGAL EN 1833 ET 1834”.
Este militar esteve em Portugal até ao fim da guerra fratricida que dilacerou Portugal.
Importa reter a sua história, ou seja os factos narrados por quem defendeu a causa Miguelista.
No prefácio da sua obra (1) o Professor António Ventura diz o seguinte:
“Sendo todos tão útil o conhecimento da verdade, bem poucos são aqueles que a gozam: uns não se querem dar ao trabalho de a investigar, outros carecem dos dados necessários para a alcançarem.
Desde que a luta principiou até que a convenção a finalizou, o partido vencedor tem procurado constantemente fazer atribuir à sua energia, valor e sapiência militar os sucessos das suas armas, ocultando ou invertendo os do contrário. Ninguém ousava patentear as coisas, posto que muitos as soubessem, tais quais tinham sucedido.
O Barão de St. Pardoux, oficial adido ao exército de D. Miguel, foi quem primeiro mostrou que a ignorância, traição e faltas de alguns dos chefes do Partido Realista foram as principais causas da vitória do Partido Constitucional.”
Feito este breve intróito vamos aos factos narrados pelos vencidos, feita por palavras de quem testemunhou muita traição. Cada um per si tire as suas conclusões e quiçá possa descobrir a origem e o estado em que hoje nos encontramos.
“ … Pelo que fica dito, os brigadeiros Bernardino e Ricardo deixaram a cidade de Coimbra, e se retiraram sobre a vila de Tomar, assim como a guarnição das fortalezas da Figueira e Buarcos às ordens do seu comandante, o coronel de artilharia António Ignácio Júdice.
Quando estas tropas chegaram a Tomar ficaram debaixo das ordens do marechal-de-Campo António Joaquim Guedes de Oliveira, o qual tinha em Ourém um destacamento de trezentos e cinquenta soldados do regimento de infantaria n.º 7 e uma força de voluntários realistas, debaixo do comando do coronel João António da Moita.
Nesta ocasião o general Lemos enviou ao general Guedes um reforço, o qual, reunido às tropas juntas em Tomar, formava a totalidade de cinco mil setecentos e sessenta e sete homens, não compreendendo os fragmentos do exército de observação sobre o Porto, nem a artilharia e a cavalaria às ordens do brigadeiro Puisseux (ver mapa ao lado).
O general duque da Terceira avançou com as suas tropas, apoiadas da direita pelas forças do capitão Napier e pela guarnição de Leiria, e protegidas no flanco esquerdo pelo exército do general Rodil.
O general realista, em consequência destes movimentos do inimigo, retirou-se sobre a estrada de Santarém pelas posições da Asseiceira, onde a 16 de Maio de 1834 recebeu o ataque do exército inimigo, comandado pelo mencionado general.
Esta acção durou por espaço de duas horas; porém, a grande superioridade das forças contrárias e a voz que se espalhou de que o general Rodil torneava a nossa direita desanimaram uma parte das tropas realistas, e esta desanimação aumentou-se quando infelizmente o brigadeiro Puisseux foi morto à frente da cavalaria realista que carregava o inimigo. A bravura deste brigadeiro levou-o à temeridade de montar à crista de uma altura que estava em frente, o que era contra as ordens que recebera do general Guedes, que lhe determinavam se limitasse tão-somente a repelir os caçadores inimigos e não subir àquela altura, onde existia uma grande força contrária, que deu sobre a cavalaria uma descarga cerrada e decidiu a sorte das armas.
Os brigadeiros Bernardino e Ricardo retiraram-se em boa ordem, não deixando todavia de sempre operar até ao momento em que atravessaram o Tejo.
A diminuição da força comandada pelo general Guedes, entre mortos, feridos e dispersos, foi de dois mil novecentos e quinze homens, não entrando neste número alguma parte da cavalaria e artilharia. Algumas das tropas dispersas nesta acção reuniram-se à guarnição da praça de Abrantes, a qual se retirou para Estremoz com o seu governador Rochelein, e sucessivamente para a praça de Elvas. Nesta ocasião a força que estava destacada em Ourém capitulou com o capitão Napier...
Os desgraçados acontecimentos que tiveram lugar contra a causa realista nas províncias do norte e o resultado da batalha da Asseiceira exigiram que o exército de operações se retirasse da vila de Santarém, ameaçada pelo norte, a oeste.
O general Lemos então destacou o brigadeiro Urbano com a cavalaria de Chaves e de Vila Viçosa para a vila de Almeirim, na margem esquerda do Tejo, para proteger a retirada do exército. Logo que este homem passou o rio, continuou a sua marcha pela mesma margem até à vila da Chamusca, quando a ordem que recebeu do general era de não passar de Alpiarça. A maneira com que este traidor iludiu a tropa do seu comando foi dizendo-lhe que a ordem que recebera lhe determinava que repassasse o Tejo para a margem direita a fim de carregar de revés o inimigo que seguia a estrada de Santarém. Efectuada a passagem, de súbito a tropa foi surpreendida pelas forças do general duque da Terceira.
A 18 de Maio de 1834 o Sr. D. Miguel passou o Tejo dando claras provas de intrepidez, e amor pelo seu exército, com aquela presença de espírito que o caracteriza nos maiores perigos.
Foi a última pessoa que se retirou do rio, que muitas vezes atravessou de um lado ao outro até pôr a salvo os indivíduos, que desejavam acompanhá-lo.”
Esta oposição de razões à estrutura da questão dá o denominado princípio do contraditório.
Por defeito de ofício, quiçá virtude, quando me contam a história dos vencedores (e a nossa história é, predominantemente, de vencedores) quase sempre é esquecida pelo escritor, ou narrador, a história dos vencidos. Daí o sábio hábito de ouvir as duas partes da oposição das suas razões e ... depois tirar as nossas conclusões.
Para fazer as contas à medida (significado de razão) procurei a versão da Batalha da Asseiceira na versão dos vencidos.
Nesta tarefa árdua ajudou-me o meu amigo José Luís Assis, historiador de generosidade do tamanho do mundo, conseguindo descobrir a obra abaixo referida. Esta versão é a do Barão de Saint Pardoux que em 1835 publicou uma obra sobre o título “CAMPAGNES DE PORTUGAL EN 1833 ET 1834”.
Este militar esteve em Portugal até ao fim da guerra fratricida que dilacerou Portugal.
Importa reter a sua história, ou seja os factos narrados por quem defendeu a causa Miguelista.
No prefácio da sua obra (1) o Professor António Ventura diz o seguinte:
“Sendo todos tão útil o conhecimento da verdade, bem poucos são aqueles que a gozam: uns não se querem dar ao trabalho de a investigar, outros carecem dos dados necessários para a alcançarem.
Desde que a luta principiou até que a convenção a finalizou, o partido vencedor tem procurado constantemente fazer atribuir à sua energia, valor e sapiência militar os sucessos das suas armas, ocultando ou invertendo os do contrário. Ninguém ousava patentear as coisas, posto que muitos as soubessem, tais quais tinham sucedido.
O Barão de St. Pardoux, oficial adido ao exército de D. Miguel, foi quem primeiro mostrou que a ignorância, traição e faltas de alguns dos chefes do Partido Realista foram as principais causas da vitória do Partido Constitucional.”
Feito este breve intróito vamos aos factos narrados pelos vencidos, feita por palavras de quem testemunhou muita traição. Cada um per si tire as suas conclusões e quiçá possa descobrir a origem e o estado em que hoje nos encontramos.
“ … Pelo que fica dito, os brigadeiros Bernardino e Ricardo deixaram a cidade de Coimbra, e se retiraram sobre a vila de Tomar, assim como a guarnição das fortalezas da Figueira e Buarcos às ordens do seu comandante, o coronel de artilharia António Ignácio Júdice.
Quando estas tropas chegaram a Tomar ficaram debaixo das ordens do marechal-de-Campo António Joaquim Guedes de Oliveira, o qual tinha em Ourém um destacamento de trezentos e cinquenta soldados do regimento de infantaria n.º 7 e uma força de voluntários realistas, debaixo do comando do coronel João António da Moita.
Nesta ocasião o general Lemos enviou ao general Guedes um reforço, o qual, reunido às tropas juntas em Tomar, formava a totalidade de cinco mil setecentos e sessenta e sete homens, não compreendendo os fragmentos do exército de observação sobre o Porto, nem a artilharia e a cavalaria às ordens do brigadeiro Puisseux (ver mapa ao lado).
O general duque da Terceira avançou com as suas tropas, apoiadas da direita pelas forças do capitão Napier e pela guarnição de Leiria, e protegidas no flanco esquerdo pelo exército do general Rodil.
O general realista, em consequência destes movimentos do inimigo, retirou-se sobre a estrada de Santarém pelas posições da Asseiceira, onde a 16 de Maio de 1834 recebeu o ataque do exército inimigo, comandado pelo mencionado general.
Esta acção durou por espaço de duas horas; porém, a grande superioridade das forças contrárias e a voz que se espalhou de que o general Rodil torneava a nossa direita desanimaram uma parte das tropas realistas, e esta desanimação aumentou-se quando infelizmente o brigadeiro Puisseux foi morto à frente da cavalaria realista que carregava o inimigo. A bravura deste brigadeiro levou-o à temeridade de montar à crista de uma altura que estava em frente, o que era contra as ordens que recebera do general Guedes, que lhe determinavam se limitasse tão-somente a repelir os caçadores inimigos e não subir àquela altura, onde existia uma grande força contrária, que deu sobre a cavalaria uma descarga cerrada e decidiu a sorte das armas.
Os brigadeiros Bernardino e Ricardo retiraram-se em boa ordem, não deixando todavia de sempre operar até ao momento em que atravessaram o Tejo.
A diminuição da força comandada pelo general Guedes, entre mortos, feridos e dispersos, foi de dois mil novecentos e quinze homens, não entrando neste número alguma parte da cavalaria e artilharia. Algumas das tropas dispersas nesta acção reuniram-se à guarnição da praça de Abrantes, a qual se retirou para Estremoz com o seu governador Rochelein, e sucessivamente para a praça de Elvas. Nesta ocasião a força que estava destacada em Ourém capitulou com o capitão Napier...
Os desgraçados acontecimentos que tiveram lugar contra a causa realista nas províncias do norte e o resultado da batalha da Asseiceira exigiram que o exército de operações se retirasse da vila de Santarém, ameaçada pelo norte, a oeste.
O general Lemos então destacou o brigadeiro Urbano com a cavalaria de Chaves e de Vila Viçosa para a vila de Almeirim, na margem esquerda do Tejo, para proteger a retirada do exército. Logo que este homem passou o rio, continuou a sua marcha pela mesma margem até à vila da Chamusca, quando a ordem que recebeu do general era de não passar de Alpiarça. A maneira com que este traidor iludiu a tropa do seu comando foi dizendo-lhe que a ordem que recebera lhe determinava que repassasse o Tejo para a margem direita a fim de carregar de revés o inimigo que seguia a estrada de Santarém. Efectuada a passagem, de súbito a tropa foi surpreendida pelas forças do general duque da Terceira.
A 18 de Maio de 1834 o Sr. D. Miguel passou o Tejo dando claras provas de intrepidez, e amor pelo seu exército, com aquela presença de espírito que o caracteriza nos maiores perigos.
Foi a última pessoa que se retirou do rio, que muitas vezes atravessou de um lado ao outro até pôr a salvo os indivíduos, que desejavam acompanhá-lo.”
BIBLIOGRAFIA:
Barão de Saint Pardoux, "A Guerra Civil em Portugal 1833-1834" Introdução de António Ventura (1), Caleidoscópio, 2007.
1 comentário:
Tenho observado o trabalho deste meu Amigo, sempre ligado à História de Portugal, a factos passados (nós não saberemos para onde ir, se não soubermos de onde viemos) e pergunto-me!?...
Porquê ter escolhido Direito, quando a sua verdadeira vocação é seguir e descobrir, a par e passo, com aquela calma que lhe conheci in illo tempore, a História, a documentação, tanto escrita como oral e até a Arqueologia como apoio!?...
Teria dado um excelente investigador criminal mas preferiu ficar-se, com a modéstia que lhe é peculiar, resolver os seus casos de Justiça, para sobrevivência!
Que a Atalaia o tenha sempre em consideração...
MEMENTO, ATALAIA!
O Dr. Fernando Freire está a fazer um trabalho bonito, organizado e persistente sobre coisas que ficariam esquecidas e que nunca mais se iriam saber, por se perderem nas cinzas do passado.
Tiro o meu chapéu ao Dr. Fernando Freire pelo seu trabalho, além de um abraço, claro.
Sérgio
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