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ATALAIA, Vila Nova da Barquinha, Portugal
Vivendo nesta terra há 30 anos vou perguntar à história e à tradição qual a origem desta localidade. Desejo saber quem neste atractivo sítio erigiu a primeira construção, quais as obras que foram nascendo, a sua idade e as mãos que as edificaram, quais os seus homens ilustres e os seus descendentes, quem construiu as estradas, os caminhos, as pontes e as fontes. Quão agradável será descobrir em cada pedra os nossos antepassados levantando com palavras o sonho do nosso futuro. Atalaia, 18-11-2007.

26.12.11

CONFLITOS SOBRE A LEZÍRIA DA ATALAIA (REINADOS DE AFONSO III E D. DINIS)

O Tejo depois de calcorrear montes e rasgar vales abraça a borda de água em Vila Nova da Barquinha. A partir daqui espalha a sua tumultuosa riqueza pelas planícies. As lezírias, mouchões e pauis acomodam-se às inundações recorrentes que invadem as terras da beira-rio, sinal de fertilidade e de abundância. Semeiam-se os campos, crescem as espigas e as vinhas, pululam olivais e a maior diversidade de árvores de fruto, avulta o gado cavalar, muar, asinino, bovino, arietino, caprino e suíno. O rio, nas zonas alagadiças, é o grande impulsionador agrícola e mercantil. Não espanta pois que este território, desde os primórdios da nacionalidade, tenha sido alvo de contendas pelo seu domínio ou posse. Os reis da reconquista concederam muitas das terras das lezírias às ordens militares mas quase sempre invocavam para a Coroa “ o direito de reconquista que filhou a terra aos mouros e a pobrou”. As mesmas lezírias foram causa para muitos conflitos no reinado de Afonso II e III, com relace para os casos da Lezíria da Atalaia, no termo de Santarém.
São estes conflitos que dou a conhecer.
Sentença dada por Paio Domingues, Deão de Évora, e Mestre Martinho, como «arvidros e compõedores», em um pleito sobre a propriedade da Lezíria da Atalaia, termo de Santarém, em que eram A. (autor) e R.(réu) respectivamente o Concelho desta vila e Lourenço Esteves de Fremoselhe, Arcediago de Viseu. O R. herdara a referida lezíria de Estêvão Joanes, Chanceler de D. Afonso II, o qual a houvera por doação do Concelho de Santarém que alegava, agora, a nulidade desta doação por haver sido feita sob coação e por temor do donatário. Os juízes julgaram nula a doação e ordenaram a restituição da mesma ao Concelho, ao qual ficaria pertencendo de pleno direito em propriedade e posse. Na sentença são transcritos por íntegra: 1) - Procuração, com poderes forenses, ao «tenente» do Alcaide, aos Alvazis, Almoxarife d’el-rei e Homens bons, datada de 12-11-1281, redigida em português. 2) - Compromisso de arbitragem entre as partes pelo qual os AA. escolhem como árbitro Paio Domingues, e os réus Mestre Martinho; datado de 12-2-1282. 3) - Libelo dos autores; sem data. Dada em Santarém, em 5.a feira, de Fevereiro de 1282. Lavrada pelo tabelião Lourenço Esteves. 530 X 259 mm., bem conservada. Teve 4 selos todos pendentes por cordão de lã vermelha, dos quais se conservam apenas o do Concelho de Santarém e um fragmento do último que era de cera vermelha e deve ser o do réu. «Gaveta» 3, M.º 7, N.º 5. Sumariado na Reforma dos documentos das Gavetas, L.º 7, fI. 116; e transcrito por íntegra na «Leitura Nova», L.º 12 da Estremadura, fI. 168, col. 1.ª. Num sumário lançado no v.º do pergaminho, por letra coeva, lê-se «Carta de juízo de avença... ». Como representantes do Concelho outorgam os seguintes indivíduos: Martim Mendes, «tenente» do Alcaide D. Martim Dade; Geraldo Rodrigues e Rui Pires, Alvazis; Estêvão Gomes Ramos; Pedro Esteves, Almoxarife d’el-rei na vila; João Gomes; Felipe Guilherme; Martim Anes, o Cancelas; João Gonçalves; Mendo Afonso; João Eanes do Ferrageal e Estêvão Eanes, o Caçapo. Quatro selos, pendentes por cordões de lã vermelha, dos quais apenas restam o do Concelho e um fragmento do último, irreconhecível, de cera vermelha. O de Santarém é de cera vermelha, de 2 faces. Circular; tem ainda visível no anverso, vestígios da orla circular formada por uma linha ponteada. Mal conservado, pois lhe falta o rebordo e parte da legenda, além de os relevos estarem já algo apagados, especialmente no reverso. Diâmetro: 630 mm. Anverso: ao centro um quadrado com 45 mm. de lado, formado de uma linha ponteada entre 2 filetes paralelos; no espaço dos segmentos circulares a legenda: SIGILL ... / ... / VILLA / ... CARE ... / em caracteres capitais romanos, mas o E uncial. No campo, um castelo de três torres ameíadas, as duas laterais mais baixas e defendidas cada uma por um muro ameíado, espécie de adarve, e rasgado de 1 porta e 2 janelas. A torre central, defendida por muro ameíado onde se rasga uma porta de arco ultrapassado. Em chefe, assente na torre central., o escudo português formado de 5 escudetes, com os 2 laterais horizontalmente; vestígios das arruelas. A silharia das torres muito regular e quadrada. A porta da torre central, em nível mais elevado, tem em frente um pavimento de lisonjas. Reverso: na mesma disposição do campo e da legenda. Desta lê-se: ... U ... / CONCILll / DE VILLA / … Campo quadrado, com 40 mm. de lado. Mesma disposição das torres, muros e portas; porém, o número dos cubelos das torres é menor (3 e 4, e não 4 e 5) e estas de menores proporções. As torres laterais tem 5 (?) pavimentos; a porta da central ladeada de seteiras; nesta, ao alto, o escudo como ficou descrito; as duas torres laterais mais largas na base.” “ Transacção amigável acordada entre o Alcaide, Alvazis e Vereadores do Concelho da vila de Santarém, Lourenço Esteves de Formoselhe, Arcediago de Viseu, e o Prior e Convento de S. Martinho de Crasto, pela qual o referido Concelho se obrigava a dar anualmente ao dito Mosteiro a quarta parte dos frutos da Lezíria da Atalaia, da qual, em sinal de reconhecimento de domínio, o mesmo Lourenço Esteves dava ao Concelho um móio de pão meiado anualmente, tudo isto em vida apenas do dito Lourenço Esteves. Ambas as partes desistem de todo o seu direito e acção, dão-se mutuamente quitações e prometem, sob juramento das Evangelhos e obrigando todos os seus bens, assim o cumprir fielmente. Após a morte do Lourenço Esteves a lezíria da Atalaia ficaria pertencendo em plena propriedade ao Concelho. A transacção fizera-se em virtude do Chanceler Estêvão Joanes ter deixado em testamento a pensão anual de 30 moios de trigo, imposta na dita Lezíria, ao Mosteiro de Crasto. Com êste doc. correlaciona-se o aqui sumariado sob o N.º ... Na transacção estão transcritos na íntegra: 1) - a procuração, de 20-6-1282, com poderes forenses, passada pelo abade Pedro Martins e convento do Mosteiro de S. Martinho de Crasto a Domingues Esteves, cónego do mesmo Mosteiro; 2) - confirmação pela Sé de Braga, passada em nome do arcebispo D. Telo, da transacção referida, datada de 20-6-1282. Lavrada em Santarém, em 10 de Julho de 1282, pelo Tabelião Pedro Esteves e com o reconhecimento autógrafo e respectivos sinais públicos dos Tabeliães públicos de Santarém: Estêvão «Juliani», João Paes, Fernando Joanes, Domingos Martins e Salvador Jaques. Gaveta 3.a, M.º 9, N.º 13.”

Bibliografia: Beirante, Maria Ângela, “O Tejo na construção do poder real na Idade Média portuguesa, de D. Afonso I a D. João I”, separata da Revista da Faculdade de Letras-História, II Série, vol. XV, Porto, 1998.
Boletim da Junta Geral do Distrito de Santarém, ano 6.º, n.º 43, 1936.

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