Numa assembleia-geral da SIRA o Dr. Paulo Picciochi abordou-me sobre a existência, aquando das invasões francesas, no Picoto da Atalaia, de um telégrafo. Fiquei curioso com a novidade. O meu amigo José Vieira (1) fez-me chegar este artigo que desde já partilho.
Desfrutem dos documentos que confirmam a existência de um telégrafo na nossa terra.
Artigo de José Manuel d’Oliveira Vieira
Um dos principais problemas que as tropas portuguesas tiveram, no início do Século XIX durante a “Guerra Peninsular”, foi a inexistência de um meio das unidades em campanha comunicarem entre si, num curto espaço de tempo. Embora entre nós já houvesse conhecimento da telegrafia visual, foi com Wellington (1810/1811) que se estabeleceram as transmissões telegráficas visuais, entre as fortificações das Linhas de Torres e os seus flancos laterais, durante as Invasões Francesas.
Para além do “Telégrafo de Bolas”, assim se denominava o sistema Inglês, os militares lusos sentindo a necessidade das tropas nacionais terem o seu próprio sistema, inventaram o “Telégrafo Óptico Português”: Francisco António Ciera e Pedro Folque, dois dos engenheiros militares portugueses desta época, desenvolveram os seus próprios sistemas nacionais. De menor alcance, mais baratos, mas mais eficientes, mais fáceis de usar e que imprimiam maior rapidez às comunicações. O sistema de Ciera utilizava um dicionário de 60.000 palavras ou frases. A par do arsenal logístico existente em Abrantes para proteger a capital do reino, foi mandado colocar nesta Vila em 1810 um “telégrafo”, para a transmissão de ordens militares, o que veio a acontecer após D. Miguel Pereira de Forjaz, ministro e secretário de Estado dos Negócios da Guerra, ter questionado Francisco António Ciera, director dos telégrafos e inventor do “Telegrafo Óptico Português”, sobre a demora da instalação do telégrafo em Abrantes. Ainda sobre a obra do Telégrafo de Abrantes, o marechal de campo José Lopes de Sousa, a partir desta Vila comunica a D. Miguel de Forjaz: Tenho a honra de informar V. Exª., que se tem trabalhado na obra do Telegrafo, e que posto senão ache completa toda a obra pelo que respeita a barraca e sua escada; o Telegrafo já poderia trabalhar; a corresponder-se com o da Barquinha cazo que aquelle de achasse pronto, mas não se avista ainda no lugar em que se pode collocar […] Abrantes 23 de Junho de 1810 No dia seguinte (24Jun), o marechal de campo José Lopes de Sousa informa D. Miguel de Forjaz: Hontem participei a V. Exª que não se avistava ainda daqui o trabalhar-se na colocação do Telegrafo no lugar da Barquinha, mas na mesma tarde já se divizava este trabalho, e o que hoje mais se verifica. Deos Guarde V. Exª Abrantes 24 de Junho de 1810 .
Apesar do sistema Ciera ser fácil de usar, o 2º Tenente do Real Corpo de Engenheiros, António Vaz da Cunha Salgado, propõe a João Lobo Brandão de Almeida, Governador da Praça de Abrantes alterar o método das comunicações telegráficas. Depois de descrever as alterações ao sistema Ciera, Salgado finaliza assim o Oficio: […] Se este meu trabalho V. S. julgar tirar utilidades nas circunstâncias prezentes, o seu bem conhecido patriotismo lhe dará o destino que merece. Ds Gde a V. Sa Abrantes 13 de Março de 1811.
Ao ter conhecimento da carta, Francisco António Ciera, inventor do telégrafo nacional, ironizou desta forma as alterações que Salgado propunha introduzir: Desconfio q. esta seja huma d’aquellas invenções, q. …são(!...) boas sobre o papel; e conq. D’ordinário se iludem os q. não tem pratica. 20 de Maio de 1811 Ass. F.A.Ciera . No contexto da Guerra Peninsular, a história do telégrafo da Vila de Abrantes continua desvalorizado. Para provar a importância deste meio de comunicação rápido (na época) vejam-se algumas das mensagens: De João Lobo Brandão para D. Miguel Pereira de Forjaz – Neste instante ás 12 do dia acabo de receber huma ordem de V. Exª pelo Telégrafo […] Abrantes 11 de Junho de 1811 5.
Num Boletim do Thelegrafo central de Lisboa do dia 13 de Abril de 1812 ás 6h da tª consta a seguinte mensagem enviada do telégrafo de Abrantes: Participar a Marechal Beresford, q. no dia 11 do corrente vierão huns 5ooo homens de Cavallaria Inimiga a Alpedrinha, Souveneira For moza (Sobreira Formosa), Fundão saquear[…] Governador. No mesmo boletim consta ainda uma outra mensagem de Lisboa para Abrantes: Mandar pelo Thelegrapho pª Abrantes o seguinte. Marechal Beresford Ordena q. Governador reúna sem demora sua Guarnição, e se ponha no melhor estado de Defeza – Mozinho – 13 de Abril de 1812.
Os últimos dados do “Telégrafo de Palhetas” ou de “Ciera”, constituído por uma armação de madeira, que se encontrava na Torre do Castelo de Abrantes, datam de 28 de Agosto de 1815. Num aviso sobre reparações urgentes no telégrafo em Abrantes consta o seguinte:
O General Azedo. Participou-lhe o 1º Tenente de Engenheiros, Director das obras de Abrantes, qu o Comandante da Artilharia lhe tinha dito, que para evitar alguma desgraça desmanchasse o Telegrafo da Torre do Castelo, que está a cahir por se acharem podres as madeiras, e que já faltão algumas: e perguntava, o que devia fazer. Azedo diz, que preciza ser autorizado para mandar remover as madeiras do dito Telegrafo supposto o estado da sua ruína […] 6. A pouca documentação que existe sobre o telegrafo visual de Abrantes e da qual tive acesso, não permite afirmar que o mesmo tivesse sido reparado e prolongado para além de 1815. O telégrafo de palhetas/ tabuinhas ou persianas, como era chamado, implantado por Francisco António Ciera, não funcionando em condições atmosféricas adversas ou de noite, foi no entanto o método mais eficaz de transmitir mensagens durante a Guerra Peninsular e após esta, prolongando-se no tempo até ao advento do telégrafo eléctrico. No ano que decorre, faz 200 anos de ter sido estabelecido na Torre do Castelo de Abrantes o Telégrafo de “Palhetas ou Persianas”. Conhecendo-se a utilidade militar que o “Telégrafo Óptico” de Abrantes teve durante a Guerra Peninsular, onde encontrar esboços, óculo, dicionário telegráfico/fraseologia, tábuas telegráficas/Instruções para o Serviço Telegráfico, quem construa uma réplica à escala natural do Telégrafo de Ciera, porque não incluir o tema num dos eventos sobre as Invasões Francesas e fazer uma recriação inédita e histórica, no local onde foi construído no ano de 1810?
O “telégrafo de persianas português”, criado pelo Doutor em Matemática, Francisco António Ciera, implantado em 1810, na Torre do Castelo, nunca foi incluído ou discutido num evento em Abrantes quando o tema é a Guerra Peninsular. Dos muitos documentos antigos (1810/1834) onde o nome de Abrantes aparece, invariavelmente, lá se encontra algo relacionado com o “telégrafo Abrantes/Barquinha”.
...
Desfrutem dos documentos que confirmam a existência de um telégrafo na nossa terra.
Artigo de José Manuel d’Oliveira Vieira
Um dos principais problemas que as tropas portuguesas tiveram, no início do Século XIX durante a “Guerra Peninsular”, foi a inexistência de um meio das unidades em campanha comunicarem entre si, num curto espaço de tempo. Embora entre nós já houvesse conhecimento da telegrafia visual, foi com Wellington (1810/1811) que se estabeleceram as transmissões telegráficas visuais, entre as fortificações das Linhas de Torres e os seus flancos laterais, durante as Invasões Francesas.
Para além do “Telégrafo de Bolas”, assim se denominava o sistema Inglês, os militares lusos sentindo a necessidade das tropas nacionais terem o seu próprio sistema, inventaram o “Telégrafo Óptico Português”: Francisco António Ciera e Pedro Folque, dois dos engenheiros militares portugueses desta época, desenvolveram os seus próprios sistemas nacionais. De menor alcance, mais baratos, mas mais eficientes, mais fáceis de usar e que imprimiam maior rapidez às comunicações. O sistema de Ciera utilizava um dicionário de 60.000 palavras ou frases. A par do arsenal logístico existente em Abrantes para proteger a capital do reino, foi mandado colocar nesta Vila em 1810 um “telégrafo”, para a transmissão de ordens militares, o que veio a acontecer após D. Miguel Pereira de Forjaz, ministro e secretário de Estado dos Negócios da Guerra, ter questionado Francisco António Ciera, director dos telégrafos e inventor do “Telegrafo Óptico Português”, sobre a demora da instalação do telégrafo em Abrantes. Ainda sobre a obra do Telégrafo de Abrantes, o marechal de campo José Lopes de Sousa, a partir desta Vila comunica a D. Miguel de Forjaz: Tenho a honra de informar V. Exª., que se tem trabalhado na obra do Telegrafo, e que posto senão ache completa toda a obra pelo que respeita a barraca e sua escada; o Telegrafo já poderia trabalhar; a corresponder-se com o da Barquinha cazo que aquelle de achasse pronto, mas não se avista ainda no lugar em que se pode collocar […] Abrantes 23 de Junho de 1810 No dia seguinte (24Jun), o marechal de campo José Lopes de Sousa informa D. Miguel de Forjaz: Hontem participei a V. Exª que não se avistava ainda daqui o trabalhar-se na colocação do Telegrafo no lugar da Barquinha, mas na mesma tarde já se divizava este trabalho, e o que hoje mais se verifica. Deos Guarde V. Exª Abrantes 24 de Junho de 1810 .
Apesar do sistema Ciera ser fácil de usar, o 2º Tenente do Real Corpo de Engenheiros, António Vaz da Cunha Salgado, propõe a João Lobo Brandão de Almeida, Governador da Praça de Abrantes alterar o método das comunicações telegráficas. Depois de descrever as alterações ao sistema Ciera, Salgado finaliza assim o Oficio: […] Se este meu trabalho V. S. julgar tirar utilidades nas circunstâncias prezentes, o seu bem conhecido patriotismo lhe dará o destino que merece. Ds Gde a V. Sa Abrantes 13 de Março de 1811.
Ao ter conhecimento da carta, Francisco António Ciera, inventor do telégrafo nacional, ironizou desta forma as alterações que Salgado propunha introduzir: Desconfio q. esta seja huma d’aquellas invenções, q. …são(!...) boas sobre o papel; e conq. D’ordinário se iludem os q. não tem pratica. 20 de Maio de 1811 Ass. F.A.Ciera . No contexto da Guerra Peninsular, a história do telégrafo da Vila de Abrantes continua desvalorizado. Para provar a importância deste meio de comunicação rápido (na época) vejam-se algumas das mensagens: De João Lobo Brandão para D. Miguel Pereira de Forjaz – Neste instante ás 12 do dia acabo de receber huma ordem de V. Exª pelo Telégrafo […] Abrantes 11 de Junho de 1811 5.
Num Boletim do Thelegrafo central de Lisboa do dia 13 de Abril de 1812 ás 6h da tª consta a seguinte mensagem enviada do telégrafo de Abrantes: Participar a Marechal Beresford, q. no dia 11 do corrente vierão huns 5ooo homens de Cavallaria Inimiga a Alpedrinha, Souveneira For moza (Sobreira Formosa), Fundão saquear[…] Governador. No mesmo boletim consta ainda uma outra mensagem de Lisboa para Abrantes: Mandar pelo Thelegrapho pª Abrantes o seguinte. Marechal Beresford Ordena q. Governador reúna sem demora sua Guarnição, e se ponha no melhor estado de Defeza – Mozinho – 13 de Abril de 1812.
Os últimos dados do “Telégrafo de Palhetas” ou de “Ciera”, constituído por uma armação de madeira, que se encontrava na Torre do Castelo de Abrantes, datam de 28 de Agosto de 1815. Num aviso sobre reparações urgentes no telégrafo em Abrantes consta o seguinte:
O General Azedo. Participou-lhe o 1º Tenente de Engenheiros, Director das obras de Abrantes, qu o Comandante da Artilharia lhe tinha dito, que para evitar alguma desgraça desmanchasse o Telegrafo da Torre do Castelo, que está a cahir por se acharem podres as madeiras, e que já faltão algumas: e perguntava, o que devia fazer. Azedo diz, que preciza ser autorizado para mandar remover as madeiras do dito Telegrafo supposto o estado da sua ruína […] 6. A pouca documentação que existe sobre o telegrafo visual de Abrantes e da qual tive acesso, não permite afirmar que o mesmo tivesse sido reparado e prolongado para além de 1815. O telégrafo de palhetas/ tabuinhas ou persianas, como era chamado, implantado por Francisco António Ciera, não funcionando em condições atmosféricas adversas ou de noite, foi no entanto o método mais eficaz de transmitir mensagens durante a Guerra Peninsular e após esta, prolongando-se no tempo até ao advento do telégrafo eléctrico. No ano que decorre, faz 200 anos de ter sido estabelecido na Torre do Castelo de Abrantes o Telégrafo de “Palhetas ou Persianas”. Conhecendo-se a utilidade militar que o “Telégrafo Óptico” de Abrantes teve durante a Guerra Peninsular, onde encontrar esboços, óculo, dicionário telegráfico/fraseologia, tábuas telegráficas/Instruções para o Serviço Telegráfico, quem construa uma réplica à escala natural do Telégrafo de Ciera, porque não incluir o tema num dos eventos sobre as Invasões Francesas e fazer uma recriação inédita e histórica, no local onde foi construído no ano de 1810?
O “telégrafo de persianas português”, criado pelo Doutor em Matemática, Francisco António Ciera, implantado em 1810, na Torre do Castelo, nunca foi incluído ou discutido num evento em Abrantes quando o tema é a Guerra Peninsular. Dos muitos documentos antigos (1810/1834) onde o nome de Abrantes aparece, invariavelmente, lá se encontra algo relacionado com o “telégrafo Abrantes/Barquinha”.
...
Pelo artigo supra podemos imaginar a importância do Picoto da Atalaia na guerra Peninsular, essencialmente o seu interesse estratégico territorial. Por aqui passaram todas as informações da Nação resultantes da ligação à linha telegráfica das Beiras (Lisboa/Atalaia/Barquinha/Abrantes/Castelo Branco/Elvas) e da ligação à linha telegráfica Lisboa/Atalaia/Tomar/Ceiras/Zambujal/Vendas D. Maria/S. Gens/Almalaguer/Coimbra).
Pelo registo documental ficamos a saber que em 12 de Abril de 1812 estiveram na Atalaya 2 companhias de Brigada da Cavalaria Inglesa.
(1) http://coisasdeabrantes.blogspot.com/,
(1) http://coisasdeabrantes.blogspot.com/,
1 comentário:
Excelente "post". A qualidade e gráfica do mapa é impressionante.
Enviar um comentário