O
traçado urbano da Barquinha cresceu junto do rio e em volta do seu
cais. A partir do rio organizavam-se todas as outras artérias da Vila.
O
desenvolvimento urbano deu-se a partir do século XVII e é consequência da
decadência do porto de Tancos. A existência de um imposto de 50 rs por pipa, e 30
rs por carga, uma provisão régia com o propósito de ajudar a Misericórdia de
Tancos, imposto que não era quebrado no porto da Barquinha, foi uma das razões
da deslocação do comércio fluvial para a novel Vila. Certo é que todo o comércio e transporte
fluvial, que acontecia no Rio Tejo, desviou-se para o porto da Barquinha
que passou a ser uma vila mercantil e alba. Os fluxos comerciais entre as
Beiras, Ribatejo e Lisboa faziam-se, principalmente, pelo rio, levando e
trazendo permanentemente produtos que aqui eram transbordados, comercializados
e levados do e para o interior dos territórios adjacentes, como é exemplo o
sal, o azeite, as madeiras, a retrosaria, etc.
A
construção das casas na zona ribeirinha era feita à base de granito e de pedra.
Também os cais dos prédios adjacentes eram destes materiais, base predilecta de
construção dos nossos antepassados. O granito era explorado nas pedreiras da
margem esquerda e direita junto de Almoroul. Na rua da Restauração, a mais
perto do rio na parte sul, localizavam-se os cais onde atracavam os barcos por
um canal ou doca. Ainda hoje se podem
vislumbrar os antigos poiais e escadas, sempre mais altos do que o normal curso
de água para evitar a sua entrada no interior dos armazéns.
Surge
o presente escrito a propósito de uma demolição que está a ocorrer numa casa na
baixa da Barquinha num edifício da família Condeço transmitida por compra e
venda a duas pessoas de nacionalidade italiana que notificadas editalmente não
procederem à conservação/reconstrução do prédio.
Este
edifício fora, em tempos de antanho, uma taberna com jogos tradicionais.
O
quarteirão onde está a ser demolido este imóvel e onde está, também, o Centro
Cultural é aquele que historicamente, em toda a zona baixa da Vila, mais nos
confessa sobre a vida antiga do núcleo urbano barquinhense, local onde se
privilegiou o comércio, a sua união com o rio, as suas vivências e até as suas
cheias. É neste quarteirão que se perpetua os vestígios da nossa história
cunhada de arquitectura e de urbanidade. É este quarteirão que nos conta que os
barquinhenses viviam de frente para o rio e virados para sul, tradição olvidada
num passado recente mas que, felizmente, está a renascer nas novas gerações
para as quais o rio passou a ser um ponto nobre.
Neste
quarteirão podemos vivificar as lajes de pedra calcária guarnecendo os
pavimentos dos pisos térreos, vestígios da adaptação local à vivência das
inundações que, frequentemente, e com a sua adversidade invadiam a Barquinha.
Cheias que eram uma bênção, tal como no rio Nilo, pois com a fertilização dos
campos nasciam os denominados “nateiros” nos quais se produziam abundantes
cereais e produtos hortícolas.
Neste
espaço urbano os pisos térreos eram ocupados com armazéns e comércio, quase
sempre ligados à faina do rio. Um dos produtos mais comercializados era o Sal
cujo topónimo deu nome à Rua (antiga Capelo e Ivens). Sabe-se que existiram
dois importantes depósitos de sal, um no edifício da Família Pereira e outro no
edifício da Família Condeço, edifício que foi agora destruído face à eminência
de ruína.
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