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ATALAIA, Vila Nova da Barquinha, Portugal
Vivendo nesta terra há 30 anos vou perguntar à história e à tradição qual a origem desta localidade. Desejo saber quem neste atractivo sítio erigiu a primeira construção, quais as obras que foram nascendo, a sua idade e as mãos que as edificaram, quais os seus homens ilustres e os seus descendentes, quem construiu as estradas, os caminhos, as pontes e as fontes. Quão agradável será descobrir em cada pedra os nossos antepassados levantando com palavras o sonho do nosso futuro. Atalaia, 18-11-2007.

13.8.13

Estradas de neveiros em Vila Nova da Barquinha

Ilustre amiga questionou-me se conhecia algo sobre o transporte de neve entre Vila Nova da Barquinha e a capital do reino, Lisboa de seu nome.
Como sou dado a desafios não olvidei tal questão e procedi investigações prévias, certo que meditação e a investigação fortificam a mente, e com a costumada prudência fiz-me ao caminho deixando aos outros a descoberta de renovadas pedras ciente que Plus vident oculi quam oculos” vários olhos vêem mais que um olho.
Interrogado o Sr. António Roldão, preclaro historiador local, pessoa com quem gosto de controverter os factos históricos da nossa terra, fiquei a saber que foi público até aos anos setenta, a presença de marco da estrada de neveiro entre Vila Nova da Barquinha e Segade, Miranda do Corvo. Mais, precisamente, o 2.º marco era fisicamente presente antes de chegarmos à cerâmica da Moita do Norte. A estrada seguiria pela Atalaia em direcção a norte. Em tal documento físico estavam inscritas as distâncias e as designações das duas localidades. Ainda, segundo o seu relato, tal marco estará depositado no antigo mercado municipal, à guarda do Centro de Interpretação de Arqueologia do Alto Ribatejo (CIAAR), de Vila Nova da Barquinha.
Redobrada a curiosidade iniciei a investigação sobre esta temática. Das buscas efectuadas foi possível apurar que já em “1619 - a Câmara de Lisboa fez contrato com Paulo Domingos, oficial de neveiro, que consistia em levar para a capital 96 arrobas de neve da Serra da Estrela para o fornecimento diário entre 1 de Junho e 30 de Setembro, a neve retirada ia em carros até à Barquinha” (1)
Fiquei surpreendido com a antiguidade do transporte do gelo, data de 1619, do(s) porto (s) da Barquinha para a capital. Um facto histórico sujeito à rigorosa investigação sobre a origem da Barquinha que, por agora, não poderei investigar.
Diz a história que terá sido Filipe II em finais de século XVI, ano de 1598 (?), a divulgar e instituir o hábito de saborear o gelado ou as bebidas geladas. Certo é que nem só da Serra da Estrela chegava o gelo à Barquinha. Tal produto era oriundo de várias localidades do reino como é exemplo o Coentral, localidade situada na serra da Lousã. Durante a invernia as gentes apanhavam a neve e depositavam-na em poços cobertos onde, depois de calcada, se conservava empedernida até ao Verão. Utilizando escadas de madeira as pessoas desciam ao fundo destes poços, com altura superior a dez metros, e à medida que neles iam sendo esvaziadas as cestas de neve os mesmos indivíduos calcavam-na com compactos maços de madeira ficando a mesma em pedra dura. O gelo era depois coberto com palha ou fetos, e isolado da luz solar, permanecendo em estado sólido até se proceder ao seu transporte. Numa primeira fase, em carros de bois, e numa segunda fase, em barcas, até à capital do reino. Tais blocos de neve ou gelo eram cuidadosamente circundados em palha ou fetos, mesmo em serapilheira ou, ainda, metidos em caixotes evitando a sua exposição à luz solar ou ao calor evitando a tudo o custo o seu degelo. 
Durante séculos o Rei e a sua Corte "regalavam-se" com doces e bebidas geladas.
Em carros de bois, pelos sinuosos caminhos das serras até ao porto da Barquinha, pelas designadas "estradas de neveiros” o gelo era transportado por via terrestre para depois seguir, pela via fluvial e pelo Tejo abaixo, até Lisboa.
Muita neve, certamente, se fundiria no transporte mas chegava com fartura à capital do reino ao ponto de o excedente ser adquirido pelo famoso Café Martinho da Arcada, no Terreiro do Paço.

     Anouk Costa, Cláudia Morgado, Marta Clemente, Rita Vale 2009


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